terça-feira, 22 de maio de 2018

"Os velhos marinheiros"

                              

            — Pois é o que eu digo!  O comandante Vasco existiu mesmo.
            — Ele e Papai Noel.  Quem me trouxe foi a cegonha.
             Larga de deboche, homem.  Tem um livro que conta tudinho.
            — É um romance, rapaz.  Não é História.
            Este diálogo estava sendo travado num bar suburbano, famoso por suas batidas e empadas diversas.  Os tipos eram comuns, de meia idade, já afetados pela manguaça.  Um exemplar estropiado estava na mão de um deles, que poderia muito bem servir de personagem para Jorge Amado.
             Quer dizer que um homem fardado é mentiroso?
             Mete na cabeça, cara.  Isto é apenas um livro dum escritor famoso.
            — Então que é verdade mesmo.  Um escritor famoso não escreve mentira.
             Ele criou a história toda.
            — Criou?  Você está dizendo que ele inventou aquilo tudo?
            — Entendeu, burrão.  Inventou sim.
            — Ninguém é capaz de inventar a vida de um homem.  Tem o nome, o lugar onde viveu, os amigos, as farras.  Invenção nada, não acredito.
             Olha, vamos parar.  Eu sou ignorante, mas já li alguns livros, quando ainda estava na escola.
             Livros de mentira ou de verdade?
             De mentira, de verdade, eu lá sei o que você quer dizer.
             Como o do comandante Vasco.  Marinha Mercante, o amigo Georges Dias Nadreau é que era da Marinha de Guerra.  Capitão dos Portos.
             Invenção também.
            Pediram mais empadas de palmito.  Os copos de batida ainda estavam bem cheios.  Já estavam no quinto martelo grande.  Clima frio ajuda.  Não perceberam quando entrou no boteco um cidadão de cabelos grisalhos, troncudo, com um paletó esquisito, grosso, azul escuro e um quepe com uma âncora.
             Os amigos permitem que eu tome um grogue junto?
             Grogue.  Era isso que ele preparava na casa decorada com objetos de marinheiro.  Que coincidência!
             Posso saber do que está falando, grumete?
             Grumete?
             Sim.  Grumete.  Ainda não me parece um marujo.
             E você quem é?
            — Comandante Vasco Moscoso de Aragão.  Um velho marinheiro, às suas ordens.


sexta-feira, 4 de maio de 2018

Caminhando


                                    

            Geralmente, quando caminhamos sozinhos, nossos pensamentos vagueiam nestes desconhecidos caminhos que a Vida nos apresenta sem cessar.
            Dia frio, sem exagero. Céu luminoso, azul intenso, que contrastava com o jeans do jovem que seguia, com descrição, a moça que estava um pouco adiante.  Esta sim, chamava a atenção.  Bermuda de lycra justa, apertada, mostrando claramente boa parte do seu corpo.  Jovem.  É bom ser jovem!
            Com o discreto andar pelo longo calçadão, beira de praia, pouco se importava se chamava a atenção.  Mas chamava, e como chamava!  Interessante.  Se estivesse se exibindo, possivelmente passaria despercebida. Não estava, daí a naturalidade da sua formosura, seu corpo atraente, sua beleza sadia e natural.  Difícil, isso!
            — E se eu chamasse você para tomar um chope gelado no bar mais famoso desta praia?  
            — Como?
            — Está ali adiante.  Chope de caneco, sabor especial, gelado como só ele.
            — Não lhe conheço, moço!
            — Nem eu conheço você.  Compromissada?   
            — Interessa?
            — Mas claro que sim.  Mulher compromissada, quando por amor, é idiotice tentar uma aproximação.
            — No momento, não.  Estou livre e muito bem.
            O elegante bar foi alcançado.  Uma? Tomaram umas quatro canecas de um chope magnífico, com tudo que pode acompanhar esta bebida.  Linguiça frita e batatas idem.
            Dia seguinte, ainda falantes e sorridentes, deliciavam-se com o café matinal, perfumando a casa dele.  Sim, casa!  Naquele local elas são muito comuns.