sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Solidão


                                                   Solidão

            Dia quente, sem exagero.  Uma brisa amenizava.
            — Mas que cara é essa?
            — A minha. 
            — A sua nada. Pensando em quê?
            — Em nada.  Ora, estou sim.  Velho, sem a força que tinha antes, potente por causa das farmácias... Prossigo?
            — Para dizer bobagem já está de bom tamanho.  Pode parar.  Acaso eu estou melhor do que você?
            — Sei lá!  Quem sabe disso não sou eu.
            Dois velhos amigos de infância, conversando o que só eles mesmos poderiam.  Aparecem muitas recordações, namoradas, moças bonitas da época, aventuras, confusões, festas e o colégio.  Este sempre foi o pomo da discórdia. Odiado por muitos, amado por poucos e necessário para todos, não havia mágica. Ou se aprende, ou morre estúpido que não teve vida condigna. É assim, não se foge a esta regra.
            — Pois eu lhe digo.  Passou dos sessenta e cinco, é melhor morrer.
            — Sessenta e cinco?  Tem muita gente bem mais velha vivendo feliz, feliz!
            — Até quando tomar o primeiro susto!
            — Homem, você está macabro!  Susto?  Que susto?
            — Aquele em saber que a sua primeira namoradinha, linda, tão doce, apaixonada, morreu.
            — Hein?
            — Morreu, rapaz, morreu.  Pensa que somos eternos?

            O velho e muito conservado alpendre, onde estavam sentados em cadeiras confortáveis, mesa longa e simples cheirando a cera,  um velho e conhecido blended, foram as únicas testemunhas.