quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

Um conto de Natal


 

                                             Um conto de Natal

 

            Não estou fazendo nada mais do que transcrevendo história que ouço há muitos, muitos anos.

            Dizem que faz muito tempo, um menino brincava com o barro.  Fazia aves, pássaros diversos.  Eram toscos; estava aprendendo.

            Mas gostava do que fazia.  Melhorava seu artesanato visivelmente, enquanto o barro úmido era moldado com carinho e trabalho cuidadoso.

            Gostava das suas aves.  A técnica estava sendo apurada e os pássaros, a cada dia que passava, mais ficavam assemelhados com os verdadeiros.

            Determinada manhã, foi brincar e trabalhar outra vez.  Retirou os que mais gostava, estavam muito bem feitos e secos.  Fez mais alguns e gostou do resultado.

            Feliz e contente gostou muito do seu trabalho.

            Na sua doce inocência infantil, bateu palmas.  Estava alegre.

            Os pássaros saíram voando...

 

            Esta foi a história que eu ouvia.  Era pequeno também.  Hoje ouço tiros, gritos, correrias e palavrões, principalmente durante os jogos de futebol.

            Sinto a fumaça que os ônibus e carros soltam, o barulho que fazem.  O calor e o abafado que não existiam há trinta anos.  Vejo os drogados.

            É certo que o progresso foi muito, felizmente.  Em todas as áreas do conhecimento e do viver.

            Mas verifico, com segurança, que o bem foi acompanhado pelo mal.

            Lastimável, isso.  Mas com o Natal, renascem nossas esperanças.  

            Feliz Natal!


Imagem: "A última ceia", de Salvador Dali

 

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Alcoolismo e neurose sobre tela

                                                           Blue Poles

 

            Os biógrafos do maior pintor americano, Paul Jackson Pollock, contam histórias sobre o conturbado artista que parecem absurdas.

            Pollock era fumante e bebedor inveterado.  Usava como suporte para sua pintura papel impermeável; era muito difícil encontrar tela de pano, devido aos tamanhos que empregava, imensos.  Tinha tendência suicida, conhecida pelos amigos.

            Certa noite ligou para um deles.  Disse que iria se matar, estava avisando.  O amigo pediu que ele esperasse um pouco, era velho companheiro de bebedeiras e gostaria de tomar a última na companhia do pintor.  Perguntou se havia bebida suficiente no estúdio.  Havia.

            Em pouco tempo estava diante do potencial suicida, que se encontrava embriagado, como de costume.  Confraternizaram-se e passaram a piorar o estado em que se achavam.  Pollock reclamando muito, inclusive da sua última obra, que chamou de “Alcoolismo e Neurose sobre tela”. O clima era este.

            O amigo estava eufórico e deu a sugestão de antes de morrer, Pollock pintasse com ele a última tela, ideia prontamente aceita.  Papel esticado no chão, pote, tubos e vidros de tinta começaram a obra freneticamente.  O uísque não parava de ser tomado, à medida que as tintas eram atiradas sobre a tela, a característica da obra do autor. Vidros se quebraram sobre a superfície, foram pisados e até hoje existe marca de sangue na pintura, que quando terminada, os autores já estavam quase dormindo.

            Quando amanheceu, Pollock já não falava mais em morte, mas passou a examinar o resultado.  O amigo preparava um café.

            O pintor escolheu a área que mais gostou, e deu o nome de “Blue Poles”, que em 1973 foi vendido ao governo australiano por dois milhões de dólares, hoje irrisórios, mas na época o mais alto preço de pintura não convencional.  Encontra-se na National Gallery of Australia, em Camberra.

            É o que se conta. 

   

 

terça-feira, 6 de outubro de 2020

"À sombra das chuteiras imortais".


 

“À sombra das chuteiras imortais”

 

Quando uso o título, que era uma coluna de Nelson Rodrigues, quero prestar uma homenagem ao nosso teatrólogo maior, a Newton Santos e a Garrincha.

Quem contou esta história, na coluna que me apoderei do nome, foi Nelson.

O Brasil jogava a Copa de 1958, na Suécia, onde após luta feroz sagrou-se campeão do mundo pela primeira vez.  Invicto!

Eram os áureos tempos de Didi, Newton Santos, Garrincha e um menino que aparecia, chamado Edson e apelidado Pelé.

Deixo o futebol de lado e passo aos fatos.  Garrincha era um cidadão que nunca ninguém conseguiu definir; se um pouco retardado ou incrivelmente ingênuo.

O fato é que viu numa loja em Estocolmo uma raridade com que todos sonhavam: um pequeno rádio de pilha. Desejo de qualquer um no Brasil possuir a cobiçada peça.

Não duvidou.  Comprou o rádio e chegou feliz com ele na concentração.

Ligou o rádio, mas as estações suecas não paravam de falar, e ele ficou muito decepcionado.  Quis trocar o rádio, mas o velho Newton Santos, seu protetor até a morte, prontificou-se.  Comprou o radinho.  Fez questão.

Newton pagou a mesma quantia que Garrincha e ficou com o rádio.

Foi o que bastou para o homem das pernas tortas, terror das defesas inimigas, sair contando que “o compadre Newton deve estar doido. Fez questão de comprar um rádio meu que só fala uma língua que ninguém entende.”

A Copa foi ganha, o Brasil vibrou e apareceu no futebol o tal garoto genial, o Pelé.  Encantou o mundo, e em pouco tempo o apelido de “Rei” foi dado e dura até hoje, merecidamente.

Chegando ao Brasil, mesmo no avião, Newton Santos ligou o famoso radinho que comprara de Garrincha.  Falava um português perfeito, captando as emissoras locais.  Garrincha não entendeu nada!  Rindo, seu velho amigo devolveu o aparelho ao antigo dono.  Não quis de forma nenhuma receber o dinheiro, embora Garrincha insistisse.  O pobre Mané não sabia que na Suécia o rádio só iria pegar ondas locais mesmo.

Ficou numa alegria de menino, coisa que ele nunca deixou de ser, e contava para todos sobre a bondade do amigo.

São coisas do futebol; coisas da vida. 

 Imagem:  Manuel Francisco dos  Santos, o Mané Garrincha.

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Altar

                                                      Altar de sacrifício

 

            Numa ilha perdida no meio do oceano, habitava um povo muito desenvolvido, social e economicamente.

            Viviam dentro de intensa paz.  Muitos cobiçavam morar em local como aquele.  Poderiam os naturais perder a tranquililade.  Um estrangeiro não acostumado destruiria a cultura daquela gente.

            Eram filósofos os grandes sacerdotes da ilha.  Os que lá chegavam, eram obrigados a responder uma pergunta.  Errando, partiam para o sacrifício no Altar da Verdade, quando apenas erravam a resposta, ou no Altar da Falsidade, quando tentavam iludir os sábios.

            Certa vez apareceu na praia, numa balsa, um estrangeiro forte e saudável, logo feito prisioneiro.

            Levado ao Grande Sacerdote, foi-lhe explicada a lei.  Ouviu com atenção.  A pergunta foi feita.  Difícil, o homem tinha aspecto de estudioso.

            - Faça uma afirmação.  Se for verdadeira, morrerás no Altar da Verdade; falsa, no Altar da Falsidade.

            Sem muito pensar, o estrangeiro afirmou “serei sacrificado no Altar da Falsidade”, o que causou logo um tumulto entre os sábios.  Não houve execução e o estrangeiro foi aclamado como um verdadeiro e grande sábio.

            Caso ele fosse sacrificado no Altar da Falsidade, teria feito uma afirmação verdadeira, logo o sacrifício seria no Altar da Verdade e neste ele não poderia ser imolado, pois de disse que seria sacrificado no Altar da Falsidade, jamais poderia ser no Altar da Verdade.

            Faz parte de a tradição esta passagem ser muito conhecida entre os que estudam lógica filosófica.

            Os maus políticos fazem muito uso dela, por serem grandes sábios da malandragem.   

 

quarta-feira, 29 de julho de 2020

Tristeza


                                                    

E não?  Estamos atravessando uma fase maldita da vida terrestre, no momento.  Pesada a expressão?  Não creio.
O mundo ficou triste, ele está triste, e não sem razão; parece que os dias felizes acabaram.  Morte.  Doença.  Sofrimento.  Dor, enfim.  Nada fizemos em prol disso, ela veio do desconhecido e está aborrecendo demais.  Todos os dias vemos o número elevado da tal covid, que ataca e mata tantos de nós.
O homem, por mais errado que seja, não merece este castigo biológico, proibido mesmo nas mais cruéis guerras que temos conhecimento.  Como dizem os juristas, é ‘insidioso e cruel’.  Fomos apanhados de surpresa, nem poderia ser de outra forma.  O tratamento que se usa é o de emergência.  Drogas conhecidas, algumas contra piolhos, imaginem!   Mas muitos têm sido salvos.  Outros tantos, não aguentam a maldade e virulência do talzinho.  Veio para causar morte.  E está cumprindo o seu dever demoníaco.
Estamos tristes, todos.  Mesmo que tenhamos cometidos os pecados mais vis que a humanidade já cometeu, muitos, muitos inocentes estão pagando pelo que nada fizeram.
Tristeza!  Justiça dos homens, justiça de Deus. Jamais acreditei nem em uma, nem na outra.

Imagem: Uma rua em Aleppo.  Banho de sangue



segunda-feira, 6 de julho de 2020

Cachaça de pote




                                            Cachaça de pote

 

            A origem da cachaça é muito incerta.  Mas o produto é genuinamente brasileiro.

            A mais tradicional explicação é que a bebida teria surgido com a degradação orgânica do melado, feito pelos escravos.  O melado era obtido através da fervura do caldo de cana, mexendo sem cessar, enquanto esquentava ao fogo.

            Um descuido fez com que o melado, guardado em pote de barro, sofresse a ação do ar e de partículas presentes, oxidando o líquido, como aconteceu com o pão e o vinho.

            O processo chamado fermentação, transformou o caldo de cana numa bebida forte, que tomada em grandes quantidades, embriagava.  Foi o que bastou para serem construídos alambiques de barro, até hoje existentes em lugares onde a bebida é artesanalmente feita.

            A bebida, repudiada pelos portugueses que não queriam ver a queda nas vendas da bagaceira, feita em Portugal e utilizando o bagaço destilado de uvas, tomou o gosto dos brasileiros.  Ilegal diante o mando português, acabou sendo livre com a Independência.

            Mas sempre foi produzida e consumida.  A melhor cachaça produzida é mesmo a que é destilada em alambiques de barro, cujo melado fermentou em potes do mesmo material.  Por ser inerte, não contêm sais de cobre, inevitáveis nos alambiques tradicionais comuns, tóxicos.  O alambique de barro é raridade; poucos lugares ainda possuem o recipiente não tóxico e que vem de muito longa data.

            A fabricação artesanal exige cuidados especiais.  Os primeiros produtos destilados, ditos “cachaça de cabeça”, devem ser bebidos apenas com muita moderação pelos apreciadores.  Fato idêntico ocorre com o final da destilação, a chamada “cauda da cachaça”.  Deve ser descartada, como a cachaça de cabeça, para a obtenção do produto que vai envelhecer, no mínimo, por dois anos em tonéis de carvalho que serviram para amadurecer vinho tinto.  É este o processo artesanal, conhecido como perfeito na produção da melhor cachaça.

            A indústria, naturalmente, não pode adotar este método, onde a produção é pequena. Usa grandes alambiques de aço inoxidável, e o caldo de cana é fermentado artificialmente.

            Gostou?  Beba uma boa dose, sem exageros.  Cachaça de pote é coisa séria...





             

 

 


quinta-feira, 4 de junho de 2020

Tempo atual


                      

            Não tenho nada com os acontecimentos.  Mas gosto da crônica, sou um apaixonado.
            Estamos num tempo horroroso.  Junho de 2020, mas a confusão deu partida no início do ano, ninguém sabe ao certo.  O assunto não me agrada nem um pouco, mas cronistas devem registrar os fatos que ocorrem no tempo em que estão vivendo, é uma obrigação.
            Arrebentou-se o mundo com este tal covid 19.  Está dizimando os povos, matando em número cada vez maior.  Ora, o fato não tem cabimento, mas é a realidade.  Doentes e mais doentes.  Mortos e mais mortos, isolamento severo no começo, agora nem tanto.  Uns dizem vírus, e agora, depois de autópsias, dizem bactérias.  Afinal, que desgraça é esta?  Ela é tanta que engana a própria informação.  
           
            O segundo fato, atualíssimo, é a ‘revolução’ que ocorre nos Estados Unidos, por causa do estopim detonado com a morte covarde de um negro norte-americano, George Floyd.  Neste momento mesmo devem estar ocorrendo passeatas de protesto contra a selvageria praticada.  Após preso e algemado, este homem teve o pescoço forçado por um policial reincidente em práticas violentas.  Em sete minutos, morreu por asfixia.  Onde estamos?  Que canalhice é esta?
            Que Trump valhe nada, todos sabemos.  Mas na sua maneira de pensar, agir e desesperadamente buscar a reeleição cabem atos desta omissiva natureza?
            Esta é uma causa dos tempos da guerra civil.  Vai continuar, sendo assistida pacificamente por um governo imbecil? O problema é histórico!

            Enquanto isso, ‘o Brasil vai bem, obrigado’.  Nestes dias atuais, melhor acreditar na frase do chanceler Osvaldo Aranha. 

Imagem: "A leiteira", Vermeer,  Museu de Amsterdam  

domingo, 10 de maio de 2020

Sem o menor cabimento


                                 

            Mas o que é isto?  Que invasão dos demônios é esta, que não respeita nada, crianças, moços, velhos, quem quer que seja?
            Colocaram um nome bonitinho nela. Covid 19, covarde, desonesta, ainda matando e sufocando a humanidade.  Castigo?  Quem pode nos castigar?  Ninguém pode!  Nem deus, em quem não acredito há muito, embora acredite em Jesus Cristo, um homem que ninguém sabe como, não trouxe ao mundo mensagens de desalentos, mas somente, e tão somente, mensagens de amor.  Filho de deus?  Sim, como todos nós.  Deus seria um espírito maior, criador do Universo, idéia bastante duvidosa.
            Que protetor é este, que castiga os ‘pecadores’?  Que é o pecado?  Acreditam nisso os menos avisados, ou os criados dentro da religião católica romana.  O Cristianismo original nunca foi o que o Vaticano prega.  Ele se apoderou de princípios sociais e irmãos sólidos, construiu suas regras e exterminou com as regras da doutrina de Cristo. 
            As seitas que o seguem são mais abomináveis ainda.  
            Tudo um grande erro de interpretação, que nem Maria reconhecem como Mãe de Jesus.  Até mesmo os maometanos reconhecem Jesus como o maior profeta que passou pela Terra.  Maomé é o anunciador de Alá, mas não tem a grandeza de Jesus, o Profeta.  
Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo.  Salve-nos iluminando as mentes humanas contra este ataque que estamos sofrendo.
Amém!    


Imagem: William Shakespeare

sábado, 11 de abril de 2020

Resposta a uma mulher misteriosa




                         Querida, como sempre você apareceu no momento certo e oportuno.
São características suas que nunca vou ser capaz de compreender.  Está em diversos lugares, como cigana fosse.  Não vale a comparação?  Cigana?  Creio que é exatamente assim. Alma cigana, não tem lugar determinado para ficar como que plantada nesta Terra nada pequena.  Fica onde gosta, conhece, bebe o vinho, experimenta o que interessa e segue em frente.  Uma maneira bastante interessante de viver.
            Talvez, eu não tenho certeza, gostasse de também viver assim.  Para ter ideia disso, só experimentando.  E para isso é preciso de um desprendimento que talvez o tempo me tenha tomado.  Não me digo velho ou sem iniciativa, mas tão somente satisfeito com o meu lugar.  Às vezes a gente pensa em mudança sim, outro país, cidade grande, alternando com lugar pequeno, com o mar e a praia servindo de área da sua morada. Vida simples, talvez enjoada e cansativa com o tempo.
            Escrever num lugar assim, quem sabe?  Deve dar bom resultado.  Concluído o trabalho, é melhor não insistir no lugar.  Se você insiste em trabalhar sentido a influência do local onde está, melhor desistir.  Vai cair em lugar comum, é quase certo.
            Gostaria muito de saber mais sobre você.  Como está sentindo a vida nestes momentos, o que vai por dentro desta alma misteriosa e ao mesmo tempo pronta para respostas que não permitam revelar sua privacidade.  Simples compreender isso.  Talvez sejamos todos assim, uns mais, outros menos.
            Continuo buscando um encontro cada vez mais verdadeiro com minha alma.  Não entendo a existência sem isso. Insistindo, parece que você vive num quarto escuro, apertado e com pouco ar.  Ora, não é este o lugar para uma vida saudável.  Se não estiver correto, por favor, corrija.
            Escrever não é nada fácil, e trabalho concluído requer boa divulgação.  Nunca este procedimento pode ser taxado como exibicionista; quem escreve tem o objetivo de transmitir, compartilhar, fazer com que o leitor pense e participe do seu texto.  Acabo de firmar contrato com uma editora americana.  Talvez ande um bocado, pois o livro fala em correrias, espionagem, mulheres sensuais, atentados, ou seja, tudo bem ao gosto dos norte-americanos.  Só deles?  Tenho cá minhas dúvidas.
            Os motivos que a trouxeram de volta não são dos mais agradáveis, mas não parecem graves.  Devo dizer que acho estranhos, mas esta sempre foi uma marca muito sua.  Escreva.  Eu também gosto de ler!
            Beijo.

sexta-feira, 20 de março de 2020

Violinista


                                               
A sala ampla e iluminada pelos raios solares abrigava músicos e seus instrumentos, num ensaio comum. Ninguém se atreve a dar concertos, ou fazer apresentações sem criteriosa preparação prévia.
Sentado na segunda fileira da orquestra, sem roupa de praxe usada nos dias de teatros cheios, o violinista olhava seu instrumento brilhante e bem tratado. Trajes simples, uma elegante camisa branca de mangas compridas, calça jeans já bastante macia pelo uso continuado e ainda cheirando a banho prolongado, frio e com sabonete de qualidade, o músico aguardava as batidas da batuta do maestro que indicam os preparativos para o início da execução.
Moço ainda, ganhando experiência, ouviu as três batidas características e o gesto do maestro avisando o começo do ensaio. A primeira peça a ser tocada era a “Barcarola”, de Offenbach. Sempre agradável, alegre e conhecida, prestava-se bem para começar os trabalhos. Ouviram-se os primeiros acordes. Soavam como o ambiente, calmo, concentrado e harmonioso.
“Segundo violino, você está desafinado.” A voz do maestro veio dura! Pegou completamente de surpresa o jovem músico, que não tivera o cuidado de fazer uma comparação com seus colegas. Realmente, estava desafinado, fato imperceptível aos ouvidos comuns, mas não ao maestro experimentado, batuta apontada para o advertido.
O “spalla”, primeiro-violinista de uma orquestra e o músico mais importante, facilmente identificado por sentar-se na extremidade esquerda da primeira fileira, sempre muito conhecedor da sua arte e pronto para substituir o maestro, se preciso for, também percebeu o fato. Seu colega estava realmente desafinado. Um pequeno aperto na cravelha e o instrumento ficou em ordem. Estes incidentes ocorrem com frequência, mas não agradou nada ao homem que pretendia falar com a jovem e bela flautista, olhos expressivos, lábios bem feitos. Ele desejava a convidar para um descompromissado lanche, talvez nem tão sem intenção assim, mas de toda forma era o que havia planejado dizer.
Desafinado... Todos ouviram, inclusive ela, que não havia notado o pequeno senão.
O ensaio terminou. O violinista desafinado saiu rápido. Não falou com a colega, que se entendia com Norma, a bela flautista, no momento beijando e totalmente encoxada com ele. Dentro do bar elegante, tomava o segundo conhaque e fumava igualmente o segundo cigarro. Afinal, o maestro apareceu, caminhando displicente na calçada, passando a mão nos cabelos. Sentiu a pequena pontada na barriga, a faca de mola, tão usada pelos ciganos, como era o músico que havia sido chamado a atenção em voz alta, todos escutando, não foi usada para causar ferimento grave ou morte.  "Sua  namorada está com o outro, desafinado idiota!  Volta lá."
Voltou. Desta vez a faca cigana foi terrível.  Sangrou profundamente os dois namorados...

Imagem: pianista de orquestra



terça-feira, 3 de março de 2020

Acontece

                                         Parar?  Não por enquanto

            Em fevereiro não postei nada, ou melhor, postei sim, mas deleitei depois.  A primeira estava com aproveitamento de letras, vinda de site amigo,  onde escrevo desde que entrei para a internet. 
            Tentei aproveitar o original.  Saiu a publicação, mas com cores nada compatíveis com as atuais. 
            A segunda, por erro.  Ao invés de entrar com uma crônica ou conto, coloquei, vejam vocês, um teste!  Muita gente se irritou, ou simplesmente não respondeu.  Perdi?  Acredito que não.  Além de continuar zelando pela limpeza do mesmo, mantenho o assunto interessante.
            Peço desculpas a todos vocês.  O fato não vai se repetir.
            Muito bem!  Não é não, mulheres não são objeto de consumo!  Que absurdo, em pleno 2020, embora pareça que estamos é declinando mesmo.  Enquanto não fica provado e estabelecido, não é não.  Nada de assédios malandros, cantadas inoportunas.  Há mais, que pretendo não citar.
            Coloquei, num site conhecido, matéria idêntica.  Preocupa-me, como homem, advogado e escritor dedicado, mas ainda não reconhecido, o comportamento humano.
            Afinal, não é não até onde?  Algumas moças usam saias que quase aparecem peças íntimas, de tão curtas.  Sapatos que colocam as pernas como se fossem para ser agarradas, e outros complementos que não me animo a escrever.  Se não é não, por favor não provoquem além do charme feminino.
            Adoro todas vocês, mulheres.  Sou nascido do óvulo fecundado de uma, que sempre amei e respeitei.  Pai natural, casado, se há curiosidade.  Também querido. Assim é o blog.  Vamos confessando nossas verdades, sem estarem  truncadas.
            É isso!

  
imagem: eu ainda não tinha barba!

domingo, 12 de janeiro de 2020

Consigo mesmo


                                       

            É possível?  Falar horas e mais horas, dias e mais dias, anos consecutivos, enfim, sem data determinada, manter um diálogo consigo mesmo?
            Não só é possível, como muitas vezes necessário.  Mas não esconda dos outros; publique, fale, pode auxiliar, confortar, ensinar alguém.  Ou levar tudo, de vez, para o buraco que sorrateiro nos espera.  Ou você pensa que não?  Ou você faz questão de nem pensar no assunto?  Ah!  Mas ele existe, como existe! Homem, você está sentado, tomando um café forte, delicioso, na hora certa, e vem um maldito AVC, ferra sua saúde, se não matar deixar sequelas indigestas. Pensa que você é alguém?  E como eu, é nada, um sujo, ou até mesmo santo num dia luminoso.  Pior: só o dia.  A Vida, algo maravilhoso que carrega, pode fugir a qualquer instante, agora para mim, por exemplo, e não permitir que eu termine esta crônica maldita.
            Vivemos uma grande ilusão realista. Dá para entender?  Mas é assim, e quem quiser entender que pense!  Estou inteiro no momento.  E depois?  Viro defunto sem mais nem menos, eu e todos nós, inclusive você que está me lendo. Escritor maldito?  Qual!  Um homem que sabe ver o que o cerca, a grandiosidade da Vida e ao mesmo tempo a sua transitoriedade.  Somos nada!
            “Porra, este cara é um derrotista”.  E eu respondo: e você um cego, ainda não percebeu que a Vida de nada vale?  Nada, absolutamente nada, não se iluda.  Vale o que você faz, o que você prega, o que você vive!  Tolice continuar: vale muitas coisas.
            Tantas pessoas nascem, vivem e morrem sem ter acrescentado nada, nem um protesto contra os safados que existem neste mundo, os pregadores do ódio, da mentira, do assalto ao bolso alheio, seja com arma de fogo ou com a caneta, hoje tão mais comum?  É problema brasileiro?  Piada, isso!  Acontece em todos os quadrantes do pequeno planeta que gira completo em torno do Sol em aproximadamente 365,25 dias, chamado Terra.  Uma mediocridade de lugar, se comparado com os grandes corpos celestes.  Mas aqui existem as belas mulheres, o sacrossanto uísque, as mais diversas e maravilhosas comidas, o sono, a fantasia, e, enfim, o amor.  O que seria destas coisas todas não fosse o Amor?
            Nada!  Absolutamente nada!