terça-feira, 19 de maio de 2009

O homem que via estrelas

Caixa de Jóias

















Nosso herói não chega a tanto. É apenas um homem comum, mas muito curioso.
Determinado dia, pegou seu velho e fraco binóculo. Estava num lugar privilegiado. A poluição luminosa, que não permite a observação do céu mesmo com instrumentos sofisticados, era ausente. Estava num pequeno hotel na Serra dos Órgãos. Lua nova, céu pontilhado de estrelas. Frio intenso, o patamar onde se instalou ventava. Indicação de um amigo oficial da Marinha de Guerra: “pega teu binóculo, arranja um lugar escuro, de preferência em noite não enluarada e olha o céu.”
Seguiu à risca o conselho. Andava meio sem perspectivas, isto é perigoso para quem já passou dos cinquenta e cinco. Dizem os entendidos que até mesmo morte pode ocorrer. Morte matada ou morte morrida. Matada, que Deus dele se apiede, é pelo próprio.
Procurava o Cruzeiro do Sul, seguindo um pequeno mapa desenhado pelo amigo. Embora o binóculo fosse fraco, pode ver a famosa Caixa de Jóias, um aglomerado de estrelas que se encontra na região do Cruzeiro. Tentou contar! Nenhum resultado diante de tamanha beleza do céu, onde são vistas muitas e muitas estrelas de todas as cores. Azuis, amarelas, verdes, vermelhas, todas grupadas. Daí o nome Caixa de Jóias. São jóias de todos, não precisam ser furtadas ou roubadas, estão sempre lá.
Começou assim. Um pequeno binóculo, sem muita resolução. Daí para passar para um telescópio poderoso, mas ainda amador, foi um passo pequeno. Por indicação do amigo, comprou um telescópio bem mais forte. Com recursos de ligar em USB com o computador, o que aumentava muito a potência do instrumento. A imagem do astro não é vista na ocular do telescópio, mas na tela do computador, muitas vezes multiplicada pelos recursos do mesmo.
Acabou estudando a ciência fascinante. Em poucos anos, conhecia os nomes de ascensão reta e declinação, as coordenadas dos astros. E as estrelas e constelações? Muitas cores, lendas. A mais bonita talvez seja a de Castor e Pollux. Os irmãos gêmeos mortos na guerra, inseparáveis e heróis. Por compaixão, Zeus lançou seus corpos ao céu, onde permanecem juntos na constelação de Gemini. O azul claro de Sirius, a mais brilhante estrela do céu.
O firmamento guarda surpresas inacreditáveis. A mais próxima estrela da terra é Rigel Kent, que aparece muito brilhante um pouco abaixo do Cruzeiro do Sul. Quando olhada sem instrumentos, só vemos uma. Um simples binóculo e aparece sua companheira, girando em torno dela, como a Terra faz com o Sol.
Passados os anos, o profundo conhecedor destes mistérios, um dia teve vontade de matar-se. Queria ver o Universo de perto, quando foi advertido por alguma voz angelical “não faça isto. Quem se mata não vê Deus.”
A advertência foi tão forte que hoje é considerado um mestre.
Tem um álbum de fotografias celestes considerado um dos mais completos do hemisfério Sul.
A vida tem muitos mistérios...

2 comentários:

Guilherme Jr. disse...

"Menino, não olha tanto pro céu que se alumbra..." - dizia a nossa avó, no sítio, quando deitávamos no terreiro e ficávamos contando estrelas... Teu conto remexeu velhas lembranças. Muito bom.

Caio Martins disse...

Mais uma na caixinha de jóias, caro mano-véio! Pode-se dizer, das mais preciosas. Bendita voz misteriosa que salva os sábios, artistas e, notadamente, os escritores e poetas. Nem a sabedoria, nem o espetáculo podem parar.

Abração.