Prisão/Google
A toalha de mesa estava clara e bem passada. Aparecia discreto bordado.
O homem solitário já havia feito o seu pedido, e no momento bebia um excelente tinto, chileno. Em mesas próximas, a conversa era baixa; gente educada.
Quem está sozinho pensa com mais calma. O vinho descia suave na garganta e ajudava a liberar os pensamentos. Vida profissional sem correrias, consultor de investimentos. O antigo aluno de Mário Henrique Simonsen, falecido, mostrava a importância de um bom mestre.
O garçom começava a servir. Trutas com aspargos, rúcula e tomates pequenos. O garfo mostrou que estavam deliciosos.
Não, ele não entendia como tudo pode acontecer. Os dois elegantes estrangeiros que entraram na sua sala de trabalho, tiveram a orientação perfeita para o investimento. Foi feito, deu resultado e veio o convite para trabalharem juntos. Lucros divididos por igual, e ele entraria sem colocar um centavo do bolso. Bastava a indicação, e assunto resolvido.
A sociedade durou pouco mais de dois anos. Para a surpresa do homem que saboreava a truta com rúcula, a polícia federal havia prendido todos. O dinheiro aplicado era produto de crime, e do tipo que a justiça detesta: tráfico de entorpecentes, ecstasy vindo da Holanda.
A soma das penas foi grande. Tráfico de entorpecentes e lavagem de dinheiro. De homem rico e namorado de bela moça um pouco mais nova do que ele, sua vida mudou. Bens confiscados, a mulher sumiu com boa parte do dinheiro.
Mas a salada estava muito bem feita, o vinho agradando cada vez mais, talvez só esquentando o corpo. O calor aumentava progressivamente, estranho, ele não entendia, calor, muito calor, cabeça pesada, queria saber o que estava acontecendo.
Acordou banhado de suor na cela que ocupava, na penitenciária de segurança máxima. Foi dado como perigoso, na sentença que o condenou.
2 comentários:
Brilhante! A ironia final é uma festa. Eitcha, Mestre Jorge: quanto mais antigo, melhor, como os grandes vinhos...
Excelente leitura! O autor prende a nossa atenção até um fim inesperado.
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