Bar limpo, sem balbúrdias desnecessárias, chope sempre
novo, gelado, gostoso de ser bebido.
Três tipos numa das mesas. Tinham idade, mas conservavam o vigor que ia
desaparecendo com o tempo. Maldito
tempo, mas ninguém sabe parar relógios, modificar a folhinha, ou o mais
difícil, mexer no movimento dos astros.
A pilha dos cartões de tulipas consumidas não parecia exagerada,
mas pequena também não era. Bem
calculado, qualquer ser normal, ainda que com doença não condenada, entenda-se
condenada com aquelas que não têm mais jeito, coração estropiado, diabetes sem
controle e vamos parando por aqui para não fazer tratado mórbido, qualquer ser
normal, convém repetir, aguenta tomar quatro chopes sem problema.
Todos com trajes de quem não está mais no batente, não
assinam ponto, não veem diário oficial, nem tentam bajular o chefete, que
quando não é colega costuma ser um imbecil.
Mesa próxima, quase colada, dois com tipo muito sem graça
e, quem sabe, suspeito. A bebida era
caipirinha, um já estava pela conta do malvado.
Segundo os entendedores, ‘Seu Tranca-Ruas’ gosta de quem já está de
fogo.
— Vão fazer lambança e não demora.
Seu Tito, um dos que estavam
na mesa do chope, comedor emérito de rolinhas assadas, farofa na manteiga e
arroz temperado com bastante louro, à gaúcha, foi quem fez a observação. Era o único que estava de calças, ei calma
lá, todos estavam vestidos, mas de calças compridas, um jeans surrado da
moléstia, só ele. Acertou. Rumo ao mar, uma guria que de vinte anos não
passava, uma com short bem insinuante, pernas perfeitas, bumbum mais do que
perfeito e andar gingado, assombrou o local.
— Caramba! Que
coisa mais linda! — Foi a vez de um dos
seus companheiros, os da turma dos antigos.
A guria, aparentemente sem prestar nenhuma atenção ao tumulto que estava
fazendo, continuou seu caminho, mas passou a andar com mais sensualidade. O traseiro estava com movimentos mais
acentuados, provocativos. Um da mesa da
caipirinha levantou rápido e foi em cima.
Conversa rápida, depois do ocorrido ela não quis dizer o que ouviu e
falou, mas todos viram que foi palmeada, e muito bem palmeada!
O tapa na cara sempre é motivo para alvoroço. Foi o que aconteceu com o atrevido. Juntou gente.
Mulher quando toma atitude violenta, sempre chama a atenção de quem quer
que seja.
Seu Tito, o mais velho de todos, o comedor de rolinhas
assadas com farofa de manteiga e arroz de louro, disparou:
— O que este cafajeste fez, além de passar a mão em você,
que todos vimos?
— Ele não perguntou o preço.
Acontece. Nem
sempre, mas acontece.
Bronzes: Ana MM Sader
11 comentários:
rss, excelente conto, Jorge, mas o final que surpreendeu!
Taí o espírito da coisa!
Grande abraço!
Deu pra rir muito, Jorge! Gostei demais!
Realmente boa a guinada no final. Lavra inspirada, Jorge.
Camarada, isso é coisa de "furingo", biriteiro e velho, ou só velho ou só biriteiro. Um abração. Celso
Acontece mesmo, Jorge. Muito bem escrito, mas a imagem está com as esculturas sem destaque.
Beijos,
Carmem
Questão de detalhes, tão somente... Afinal, o que é uma "mão" no lugar certo, na hora certa?
Abraço.
Prezado Jorge. Sempre um belo conto. Há pouco tempo, li no preTexto, a crônica "Anônimo Suburbano" da querida Rosa Pena, e saboreei as minhas "lembranças cariocas". Este caipira das barrancas do Tietê, na juventude, teve em três fases, contato mais estreito com o Rio. Relatei na minha página algumas peripécias. Você e Rosa com a sensibilidade que têm, me fazem lembrar o espírito e o savoir vivre dos cariocas. No seu conto eu estaria na mesa dos chopps, e, lembrando-me que tenho clavículas e outros ossos finos, não correria o risco de abordar as “malhadas” dos tempos atuais, rs. Parabéns, abraço.
Jorjão,
Por essas e por outras, que sempre preferi a mesa de chopes. Até porque, os da mesa de caipirinhas não sabem que Tom e Vininha podiam dizer "Ah! Que coisa mais linda...", porque tomavam uísque e naquele tempo, pelo menos no Veloso, não passava garota de programa, só de Ipanema.
Meu carinho, parceirinho,
Anderson Fabiano
Jorge, muito bom, como sempre, esse conto. O Tranca-Ruas,
bem que podia ter evitado essa confusão rss...
Lindas as esculturas...da filha?
Amigo, parabéns e beijos!!!
Jorge,ótimo conto com final perfeito...
Belas esculturas...bjus
Muito bom o conto, com a principal característica de conto: final surpreendente. Abrs. Mardilê
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