Tempo quente, ora calor, ora frio, ninguém entende mais
nada. Pouco importa.
O fato é que estavam todos sentados num bar elegante,
manhã ensolarada, chopes bem tirados saindo em seguida. Cinco.
Eram cinco: três amigos e dois convidados. A conversa não poderia ser outra:
política. Dependesse deles os problemas
da nação – quem sabe do mundo – estavam resolvidos. Mas passa uma mulher, talvez vinte e quase
trinta, que assombra. Alta, boa
desenvoltura e boa mesmo, bonita, bem feita.
— Homem de Deus, o que é isso?
— Uma mulher bonita, não está vendo?
— Claro que sim, não sou cego. — Tomou um gole
grande. Chope de melhor qualidade. Viu um dos funcionários, com uma faca
especial para boa cozinha, cortando finas fatias de linguiça. Depois, cubos de provolone.
— Quem será esta, não conheço e moro aqui há anos.
— Também estou vendo pela primeira vez. Boa e linda
demais.
A bela mulher acabara de virar alvo de investigações de
gente não lá muito recomendável. Quer dizer, fofoqueiros, o que não é boa
referência para homens. “Alfredo
Maluco”, que só pelo apelido já fica apresentado, pensou alto: — Conheço, mas não sei de onde.
Nem poderia lembrar direito, já estava de fogo. Um dos participantes da mesa estava
visivelmente nervoso. Aparentemente, sem
nenhuma razão. Especialista em previsões de mercado futuro, na bolsa de São
Paulo, era frio por natureza da profissão.
Mas estava.
A tal mulher maravilhosa não foi à praia, estava fazendo
compras pequenas num mercado da vizinhança.
Seu erro, talvez, fosse o short curto, que permitia visão completa. O traseiro, que traseiro! Pernas perfeitas, para a imaginação dos que
viam aumentar bastante. Ela conseguiu
centralizar a conversa. ‘Alfredo Maluco’
morava muito perto dali. Pegou o celular
— quem não usa estes aparelhos hoje? — e ligou para o filho. Catulo, nome dado em homenagem ao poeta e
compositor Catulo da Paixão Cearense, em pouco tempo estava junto ao
grupo. Sentou-se junto a todos, bebia
pouco, não gostava de chope, foi de cerveja mesmo. O pai cochichou algo no seu ouvido. Ele foi
até o mercado e viu a mulher.
— Piranha, pai. Os
novinhos da área ela já devorou todos.
— Hã? Você também?
— Eu não, mas o Luis já castigou. – Luis era o irmão,
pouco mais velho.
— Tem certeza?
— Absoluta! — O marido, perto, escutou tudo.
Ela estava voltando.
Um pequeno volume de compras na mão direita. O marido, que estava sentado com eles, já
desconfiava fazia tempo, deu um salto, pegou a faca do cozinheiro e enfiou sem
dó nem piedade no bucho da gostosona.
Acontece. Pegou
apenas oito anos de reclusão, homicídio simples.
13 comentários:
Melhor ser feia mesmo... Não chama a atenção e permanece viva... vivíssima!! [risos]
Abraço.
Calado, sim. Manso, nunca mais! É...
Abraços pra você, Jorge.
Ah, Catulo, você entornou o caldo!...
Jorge, meu amigo, gostei muito de ler você.
Um interessante texto muito bem construído, que aborda a tragicidade do cotidiano. Os diálogos internos dão indícios do desenrolar do climax. Aplausos!
Este 'encosto' de Nelson Rodrigues não abandona você, Jorge.
Gostei muito do seu ritmo.
Beijo. Carmem.
Grande Jorge! Mestre, superou-se... Jogo rápido, clima intenso e final surpreendente! Gostei! Muito...
Abraço, parceiro!
Quem diria!
Às vezes, melhor não dizer...
Sete anos:está barato matar,hein Jorge?
Gostei bastante deste conto que mostra
a realidade brasileira em uma de suas facetas.
Parabéns,saudações.
Belo conto, é a cara do Brasil! Não gostou? Desconfiou? Tira de cena!
E pegou pena branda... eta país que não valoriza a vida!
Muito bem bolado esse seu conto, Jorge, parabéns. E é bem assim a coisa...
Abraços, meu amigo.
Jorge,contou com maestria nossa realidade atual...Bjus
Fatos da vida real?!
Não basta ter mulher bonita, tem que dar conta do recado..kkkk.
Final trágico e irritante. Se o chifre fosse dele teria terminado como? Do jeito que a coisa anda...achoq que ele acabaria separado em duas malas!
Jorge, meu querido, você assusta com esta realidade!
Bom fim de ano! Meu beijo.
Duda
E se "piranha" fosse invenção do Catulo que, tentando uma investida, levou um baita safanão na cara e aproveitou-se para dizer em pleno ar livre que a "piranha" tinha sido provada pelo Luís - ficou provado isso?
Há controvérsias aí. Tinha é que ter enfiado a faca na cara do Catulo- o linguarudo!
Deus do céu!
E se fosse imaginação do filho?
Mas acontece! Falta de experiência em silêncios.
Postar um comentário