“À sombra das chuteiras imortais”
Quando uso o título, que era uma
coluna de Nelson Rodrigues, quero prestar uma homenagem ao nosso teatrólogo
maior, a Newton Santos e a Garrincha.
Quem contou esta história, na coluna
que me apoderei do nome, foi Nelson.
O Brasil jogava a Copa de 1958, na
Suécia, onde após luta feroz sagrou-se campeão do mundo pela primeira vez. Invicto!
Eram os áureos tempos de Didi, Newton
Santos, Garrincha e um menino que aparecia, chamado Edson e apelidado Pelé.
Deixo o futebol de lado e passo aos
fatos. Garrincha era um cidadão que
nunca ninguém conseguiu definir; se um pouco retardado ou incrivelmente
ingênuo.
O fato é que viu numa loja em
Estocolmo uma raridade com que todos sonhavam: um pequeno rádio de pilha.
Desejo de qualquer um no Brasil possuir a cobiçada peça.
Não duvidou. Comprou o rádio e chegou feliz com ele na
concentração.
Ligou o rádio, mas as estações suecas
não paravam de falar, e ele ficou muito decepcionado. Quis trocar o rádio, mas o velho Newton
Santos, seu protetor até a morte, prontificou-se. Comprou o radinho. Fez questão.
Newton pagou a mesma quantia que
Garrincha e ficou com o rádio.
Foi o que bastou para o homem das
pernas tortas, terror das defesas inimigas, sair contando que “o compadre
Newton deve estar doido. Fez questão de comprar um rádio meu que só fala uma
língua que ninguém entende.”
A Copa foi ganha, o Brasil vibrou e
apareceu no futebol o tal garoto genial, o Pelé. Encantou o mundo, e em pouco tempo o apelido
de “Rei” foi dado e dura até hoje, merecidamente.
Chegando ao Brasil, mesmo no avião,
Newton Santos ligou o famoso radinho que comprara de Garrincha. Falava um português perfeito, captando as
emissoras locais. Garrincha não entendeu
nada! Rindo, seu velho amigo devolveu o
aparelho ao antigo dono. Não quis de
forma nenhuma receber o dinheiro, embora Garrincha insistisse. O pobre Mané não sabia que na Suécia o rádio
só iria pegar ondas locais mesmo.
Ficou numa alegria de menino, coisa
que ele nunca deixou de ser, e contava para todos sobre a bondade do amigo.
São coisas do futebol; coisas da vida.
14 comentários:
Que finura no escrever, querido Jorge!
Saiu no Pravda, lembro bem. Aliás, não sei a razão de você ter abandonado um dos maiores jornais do mundo! Você nem mesmo socialista é, já declarou isso várias vezes. Esta gente é engraçada. Fala o que não sabe, enquanto você lança um peça alegra, verdadeira, que faz parte da história do futebol brasileiro. Onde descobriu, não sei. Se quiser, diga depois, ela tem arte! O próprio diretor do Pravda, Timi, acabou assinando com você! Ora, querido, isso não é para qualquer um!
Beijo. Carmem
Artista por emoção, pintor, escritor, escultor, filósofo, dentre outras atividades. Advogado por razão.Parabéns Ana Sader!
Carmem, eu disse quem contou. Foi o próprio Nelson Rodrigues, na sua coluna em "O Globo", com o nome desta crônica.
Beijos.
Desconhecido, obrigado pelos exageros afetivos! Naturalmente você conhece bem o casal! Abraço grande, obrigado!
Formidável! Raro aparecer no blog matéria tão isenta, verdadeira e, sobretudo, bonita!
Jorge (rsss) achei essa história fantástica, minha imaginação voou e dei boas risadas, eu não conhecia! Talvez por ser 'desligada' de futebol.
Excelente postagem, enviei esse link para umas pessoas.
Aplausos pela postagem, amigo!
Beijo, um bom fim de semana.
Jorge
Lendo e regredindo no tempo!
Posso dizer que assistir aos jogos, onde,
esse atleta atuou foi um privilégio.
Ele desconcertava os adversários, saudade desse tempo!
Foi muito bom ler sua crônica nessa noite.
Bom final de semana a você e familiares!
Nadir D'Onofrio
Uma história de leitura deliciosa, do mundo do futebol de outros tempos, com a ingenuidade e autenticidade tão próprias dos mesmos... hoje em dia... qualquer história de bastidores deste universo, quando vem cá para fora... já vem cheia de jogo, mesmo...
Perdeu-se a magia da espontaneidade... hoje em dia... até uma simples selfie é ensaiada à exaustão...
Gostei imenso! Deixo um beijinho e votos de uma boa semana e continuação de um excelente mês de Outubro!
Ana
Gozei de ler essa história divertida .
abraço
Que publicação enriquecedora!
Uma história muito interessante, ingénua e apelativa. Como tudo era diferente noutros tempos!
Beijos e dias felizes.
Gostei de ler e não me admiro. Naquela época havia muita ingenuidade e muito poucos tinham estudos suficientes para saberem uma série de coisas. Recordo-me que na aldeia onde vivia, nessa mesma década apareceu por lá uns homens do cinema. Ninguém lá tinha visto. Era verão foram postas umas quantas cadeiras na rua e o filme foi projetado numa parede. Não me lembro do nome do filme, eu não teria mais de 6 anos na altura. E quando surgiu uma manada de cavalos, toda a gente fugiu para casa e deixaram os homens sozinhos a metade da bobine.
Abraço, saúde e boa semana
Jorge : seu blog é bem interessante...e essa homenagem ao Garrincha ...deixou o meu coração de botafoguense mais feliz!!!
Um grande abraço pra ti de boa noite.
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