terça-feira, 20 de outubro de 2015

Acertando o rumo


                                                 Acertando o rumo

            Dia frio, sem exageros.  A varanda do casarão tinha três homens, que sentados em torno de mesa enorme, cadeiras confortáveis, armário de bebidas para ninguém botar defeito.  O panorama que se via era verde, um pouco desmatado em frente à casa, mas disperso por todo resto.
            Montanhas.  Muitas, de pouca altura, mas paleta de pintor experimentado no verde.  Casarão?  Para os dias de hoje, sim.  Três banheiros e cinco quartos, mesmo que em lugar bem perto da civilização que conhecemos, a casa era muito grande sim.  Grande, simpática e aconchegante, num local perto de Teresópolis.  Local privilegiado.
            — A coisa não está tão feia, Leandro.
            — Como não está?  Inflação, desemprego, safadezas políticas uma após outras, recessão, e você acha isto pouco?
            — Não se trata de achar isto ou aquilo, meu caro.  O que eu pergunto a mim e a vocês é a saída desta confusão toda.
            — Como de todas as outras vezes. Já somos calejados com governos de exceção.
            — Mas este não é assim, foi eleito!
            — Acha mesmo que estas eleições foram honestas?  Enquanto aquela maquininha de votar não imprimir o seu voto, eleição para mim é fraude eletrônica.
            — Um deputado apresentou projeto sobre isto.  Reacionário, mas seus colegas aprovaram.
            — Está parado.  Claro que não vai dar em nada, estamos no país da falsidade. — Estendeu o braço, apanhou a garrafa com a estranha mistura, cachaça com canela em pau, envelhecida em pequeno tonel de carvalho, era o orgulho deles.  Todos amigos de longa data, podiam ficar sob o mesmo teto sem maiores dificuldades, fato raro.
            — Claro que não confio nesta máquina.  Sem imprimir meu voto, nada feito.  Fraude eleitoral, brasileiro é muito presunçoso, acha que pelo fato do resultado sair  no mesmo dia da eleição, somos os maiores do mundo.
            — Mas desviamos o assunto.  E a solução?  Dólar a mais de quatro reais, exportações difíceis, férias coletivas para evitar desemprego em massa. Onde isto termina? — O que falou era o único que protegia a cabeça, era careca, usava um gorro de lã.  Velhos têm medo da pneumonia.  Quando ataca, é difícil sair dela, se não estiver forte.  Este, de forma um tanto neurótica, protegia-se da morte tomando chá verde em jejum.  Depois, era o café, com frutas, torradas, queijo e iogurte, prescrição da dietista.  Mas na hora de beber, adeus prescrições. Estava certo, o velho Cidoca, apelido comum para o seu nome, Alcides.
            — Quem enxergar a melhor saída que se pronuncie.
            Não há melhor ou pior saída.  Há trabalho honesto, por parte de todos, fato que se torna obrigatório em todas as sociedades.  Uma vergonha brasileira!  Sair em todas as manchetes mundiais como país desonrado.
            Este fato é novo.  Na verdade, o Brasil nunca significou nada, para o mundo externo.  Com o trabalho desenvolvido, conseguiu a sexta posição como país mais rico.  Em menos de um ano, passou para a décima posição, e se persistir esta crise criminosa que o governo teima em politizar, vai acabar como completamente desmoralizado.
            — Vou repetir. Quem souber a melhor saída que se manifeste.
            Ninguém falou nada!  Silencio absoluto.  Surgiu então, na cabeça de todos, a velha afirmação de Capistrano de Abreu, historiador de bom conhecimento: “Todo brasileiro deve ter vergonha na cara”.  É a melhor e mais sábia solução.   

13 comentários:

Rita Lavoyer disse...

Vergonha na cara falta à maioria dos brasileiros, que sentem prazer em rir enquanto é 'ferrado' pra valer.
Sinceramente?
Pensei que um dos amigos, o tal que se manifestaria com a melhor saída, tomaria um gole de cachaça envenenada antes mesmo de se pronunciar.
Pirei!

Shirley Brunelli disse...

Jorge, sua crônica, fez-me lembrar uma frase conhecida de todos: "Todo povo tem o governo que merece". O brasileiro gosta de levar vantagem, lembra a lei de Gérson?
Pois bem, aqui vai um exemplo... Uma pessoa do meu relacionamento, teve sua TV e computador danificados por um raio. Ela, então, acionou a Seguradora da casa para cobrir os prejuízos. Mas, o que ela fez antes? Foi na casa da filha e pegou uma TV que não funcionava e disse ser sua também...
Já entendeu? Imagine essa pessoa ocupando um cargo do Governo, o quanto roubaria? A maioria da população, é assim.
Esse mesmo indivíduo está executando outra maracutaia. Não vou contar para não me alongar...
É lamentável.
Beijos, Jorge!!!

Caio Martins disse...

Muito bom, Jorge! Gostei da história do gorrinho do careca! Quanto à solução, melhor deixar quieto para não horrorizar até os mais experientes e duros! Forte abraço!

Anderson Fabiano disse...

"Vergonha na cara", Jorjão?
Eu tenho, você tem e mais uma turma boa esparsa por aí tem. Mas, a massa... sei não. Está mais para "Bolsa família na cara"!
Dia desses, eu e Helena, passeando por um lugar paradisíaco dessas bandas catarinenses fizemos uma foto e postamos no Face. Choveram "curtir" e comentários elogiosos ao casal. Pra mais de 100. Algum tempo depois a Dilma disse que o dinheiro dos aposentados havia sumido. Meti a boca! Disse que o governo não podia alegar falta de caixa porque aquele dinheiro em questão não era do governo, mas dos trabalhadores que, ao longo de anos de trabalho honrado haviam entregue, compulsoriamente, para custódia do governo. Deu uns 10 "curtir" e uns três comentários chochos. Vergonha na cara...nem na Facelândia, amigo.
Aí, pra não chorar, endireito meu boné, peço uma "branquinha" e venho aqui hipotecar minha solidariedade ao amigo.
Meu carinho,
Anderson Fabiano

Dolce Vita disse...

Meu desencanto se estende a todos os partidos. Por isto, haja vergonha...

Carmem Velloso disse...

Jorge, o comentário de Shirley chama bastante atenção. O povo quer se aproveitar de tudo, imagine quando tem poder. A lição de Capistrano é certa, muito falada e você gosta dela.
Mas parece que o mal é de raiz mesmo. Espero estar profundamente errada.
Beijos
Carmem

Unknown disse...

Sim, concordo com Capistrano de Abreu, falta "vergonha na cara" dos que dirigem este pobre e grande gigante. Abrs

Tais Luso de Carvalho disse...

A falta de vergonha começa já embaixo, numa simples fila de Banco, de cinema, do supermercado em que muitos querem levar vantagem e furam a fila. Ali começam a mostrar a falta de caráter. Quando chegam no topo da pirâmide, todos esses já são professores e com seus respectivos alunos. Sim, também acho que temos o país que merecemos.
Quanto ao voto eletrônico... Cruzes, nada a declarar.
Abraço.

Célia disse...

Acertando o rumo?
Olhe, caro Jorge, do jeito que o lamaçal excrementoso anda... nem de bengala, de andador, de cadeira de rodas, drone, ou jatinho dá certo... Pois, tudo se atola! Haja branquinha!
Abraço.

Marcelo Pirajá Sguassábia disse...

É esse o problema do brasileiro: sentam-se à volta da mesa quando deveriam virá-la! Abraços, meu amigo.

iderval.blogspot.com disse...

Meu Guru mais um primor , a realidade vivida e que se arrasta nos bastidores devido a cumplicidade implícita e explicita dos contra e dos a favor. Acorda Brasil.

Caio Martins disse...

A literatura sempre projeta o inconsciente coletivo... Muito bom, Jorge! Gostei demais! Forte abraço...

Rita Helena Neves disse...

O brasileiro se deixou ser colonizado, por preguiça. Não quer ter trabalho algum: pensar, estudar, reivindicar, lutar... Ainda que pelo seu direito... O povo é preguiçoso.
No Brasil, a preguiça... Abunda!