quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Velhas histórias





No período em que se aposentou, meu pai, um espírito inquieto que não sabia ficar parado, e quando ficava aparentemente neste estado luzes vermelhas sinalizando perigo eram ou deveriam ser acesas, dedicou-se a escrever sobre Bom Jardim, sua cidade natal, onde suas estripulias eram conhecidas.
Estudante de direito, morando em Niterói, quando na pequena cidade, certa feita, debochou dela, dizendo jocosamente que andaria nu na rua, durante a noite, e ninguém iria tomar conhecimento do fato; não o veriam. Deu aposta. Os amigos duvidaram e esperaram anoitecer. Por volta das onze horas, Jorge Sader desfilava nu nas ruas de Bom Jardim. Alguém comunicou o fato ao delegado, que o prendeu e expulsou da cidade. No dia seguinte, em companhia do seu irmão de leite Francisco, o Chico, negro retinto, bem-humorado, contador de histórias e valente quando tomava umas cachaças, os dois davam 'bananas' para a população, do trem que os trazia para Niterói.
De outra feita, sabedor pelos amigos e moradores do perigo que uma caixa d'água na estação ferroviária apresentava, resolveu o problema com o seu companheiro, amigo e irmão Chico. Parece que Antonio José Monnerat Netto teria participado também, não me recordo. Prepararam o atentado com gasolina nos pilares da caixa, e durante a noite ela veio abaixo. Outra expulsão...
O livro que queria publicar ficou inacabado, e o texto era muito pequeno. Lamparina de Oratório Velho, que resolvi juntar alguns contos e crônicas de minha autoria e publicar usando o seu título.
É um livro sem pretensões, simples, de leitura fácil, mas não por isso uma mediocridade impressa.

Link da editora:  

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Não escrevo poesias



                                          

                Muito poucas vezes arroguei-me postar poesias.
            Justifico-me.  Sinto minha pequenez diante de poetas que conheço e admiro, e não tenho a ousadia de como eles criar.  São maiores, não estão ao meu alcance, gigantes que o tempo consagrou, os professores louvam embevecidos, a crítica aplaude — ainda que nem toda concorde com os poetas e poemas, mas teme ser apedrejada caso discorde.
            Longe de mim julgar os corajosos literatos que não permitem ficar estacionada a poesia, repetindo os antigos mestres.  São corajosos!  Como não possuo tal desprendimento, admiro os poetas que não deixam fenecer a arte dos versos.
            A grandeza de tantos famosos amedronta o cronista, que dá como exemplo o seu poema favorito, uma redondilha maior onde Castro Alves mostrou todo o esplendor do canto.

 O Livro e a América

Talhado para as grandezas,
Pra crescer, criar, subir,
O Novo Mundo nos músculos
Sente a seiva do porvir.
— Estatuário de colossos —
Cansado doutros esboços
Disse um dia Jeová:
"Vai, Colombo, abre a cortina
"Da minha eterna oficina...
"Tira a América de lá".
Molhado inda do dilúvio,
Qual Tritão descomunal,
O continente desperta
No concerto universal.
Dos oceanos em tropa
Um — traz-lhe as artes da Europa,
Outro — as bagas de Ceilão...
E os Andes petrificados,
Como braços levantados,
Lhe apontam para a amplidão.
Olhando em torno então brada:
"Tudo marcha!... Ó grande Deus!
As cataratas — pra terra,
As estrelas — para os céus
Lá, do pólo sobre as plagas,
O seu rebanho de vagas
Vai o mar apascentar...
Eu quero marchar com os ventos,
Corn os mundos... co'os
firmamentos!!!"
E Deus responde — "Marchar!"
>
"Marchar! ... Mas como?... Da Grécia
Nos dóricos Partenons
A mil deuses levantando
Mil marmóreos Panteon?...
Marchar co'a espada de Roma
— Leoa de ruiva coma
De presa enorme no chão,
Saciando o ódio profundo. . .
— Com as garras nas mãos do mundo,
— Com os dentes no coração?...
"Marchar!... Mas como a Alemanha
Na tirania feudal,
Levantando uma montanha
Em cada uma catedral?...
Não!... Nem templos feitos de ossos,
Nem gládios a cavar fossos
São degraus do progredir...
Lá brada César morrendo:
"No pugilato tremendo
"Quem sempre vence é o porvir!"
Filhos do sec’lo das luzes!
Filhos da Grande nação!
Quando ante Deus vos mostrardes,
Tereis um livro na mão:
O livro — esse audaz guerreiro
Que conquista o mundo inteiro
Sem nunca ter Waterloo...
Eólo de pensamentos,
Que abrira a gruta dos ventos
Donde a Igualdade vooul...
Por uma fatalidade
Dessas que descem de além,
O sec'lo, que viu Colombo,
Viu Guttenberg também.
Quando no tosco estaleiro
Da Alemanha o velho obreiro
A ave da imprensa gerou...
O Genovês salta os mares...
Busca um ninho entre os palmares
E a pátria da imprensa achou...
Por isso na impaciência
Desta sede de saber,
Como as aves do deserto
As almas buscam beber...
Oh! Bendito o que semeia
Livros... livros à mão cheia...
E manda o povo pensar!
O livro caindo n'alma
É germe — que faz a palma,
É chuva — que faz o mar.
Vós, que o templo das idéias
Largo — abris às multidões,
Pra o batismo luminoso
Das grandes revoluções,
Agora que o trem de ferro
Acorda o tigre no cerro
E espanta os caboclos nus,
Fazei desse "rei dos ventos"
— Ginete dos pensamentos,
— Arauto da grande luz! ...
Bravo! a quem salva o futuro
Fecundando a multidão! ...
Num poema amortalhada
Nunca morre uma nação.
Como Goethe moribundo
Brada "Luz!" o Novo Mundo
Num brado de Briaréu...
Luz! pois, no vale e na serra...
Que, se a luz rola na terra,
Deus colhe gênios no céu!...

Castro Alves