quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Juventude

  Liceu 'Nilo Peçanha'











Ser moço, ainda adolescente, é muito confortável quando apenas se estuda.
Era o caso. Não necessitando trabalhar, fazia o seu curso ginasial, logo sucedido pelo complementar. Época que o secundário completo ainda era o ginasial, de quatro anos, e o científico ou clássico, de três.
O colégio era público e excelente, melhor do que qualquer outro particular.
Disciplina rígida sem ser ditatorial. Misto. Época que ainda não se conheciam os malefícios do cigarro. Todo maior de quatorze anos, desde que o pai, mãe ou responsável autorizasse na caderneta o uso do fumo, longas tragadas eram feitas, na hora do recreio. Nos intervalos entre uma e outra aula também. O banheiro era fumaça pura.
Professores rigorosos, alguns tidos como carrascos. Esta fama sempre a teve o lente de matemática. Mas qual! Muitos outros competiam com ele; alguns bem piores. Estaria certa esta política educacional? Nunca foi estudada. Mas no Rio, o “Pedro II”, o “La-Fayette” e o “Santo Inácio”, estes dois últimos particulares, formavam excelentes alunos.
Em Niterói, era o Liceu “Nilo Peçanha”, público e o mais rigoroso. Foi aonde ele fez o seu curso. Quem foi aluno, sente saudades. Educação de primeira linha. Mas acho uma coisa interessante. Começou a estudar francês no primeiro ano ginasial. Inglês, no segundo. Ou foi péssimo aluno, ou todos estes anos não valeram de nada.
Como a mãe falava com desembaraço o francês, aos cinco anos já sabia muita coisa, se é permitida a palavra.
Mas não é isto que quero dizer. Havia moças lindas, apaixonou-se perdidamente por diversas. Aconteceu o mesmo fato comigo, como era de esperar-se. Mas estava numa crise de paixão e não pude avaliar a linda moça que se declarou a mim. Perdão! Fui inclusive bastante mal-educado, disse que já tinha namorada. Mentira pura! A moça era linda...
Aos dezessete anos de idade, declarou sua vontade.
- Talvez – foi a resposta.
Talvez de mulher quer dizer nunca, neste caso. O que ele só veio a saber bem mais tarde.

sábado, 26 de dezembro de 2009

Recado

  Escrevendo/Google

















Papel, se alguém perguntar,
Diga que as coisas vão bem.
Que ainda posso falar
O que na cabeça me vem.

Que a Vida vai passando
Como é de se esperar.
E eu sempre teimando
Insisto no meu lugar.

Desistir não posso nem devo;
Não há lugar pra fraqueza
Se no contorno d’alma o relevo
Não me mostra tibieza.

Papel, se alguém perguntar,
Diga que as coisas vão bem,
Que ainda posso amar
As coisas que o mundo tem.

Diga também, por favor,
Que embora com a alma ferida
Ainda sinto o ardor,
Nas veias da minha Vida.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Natal

Árvore/Rio de Janeiro










Não estou fazendo nada mais do que transcrevendo história que ouço há muito muitos anos.
Dizem que faz muito tempo, um menino brincava com o barro. Fazia aves, pássaros diversos. Eram toscos; estava aprendendo.
Mas gostava do que fazia. Melhorava seu artesanato visivelmente, enquanto o barro úmido era moldado com carinho e trabalho cuidadoso.
Gostava das suas aves. A técnica estava sendo apurada e os pássaros, a cada dia que passava, mais ficavam assemelhados com os verdadeiros.
Determinada manhã, foi brincar e trabalhar outra vez. Retirou os que mais gostava, estavam muito bem feitos e secos. Fez mais alguns e gostou do resultado.
Feliz e contente gostou muito do seu trabalho.
Na sua doce inocência infantil, bateu palmas. Estava alegre.
Os pássaros saíram voando...

Esta foi a história que eu ouvia. Era pequeno também. Hoje ouço tiros, gritos, correrias e palavrões, principalmente durante os jogos de futebol.
Sinto a fumaça que os ônibus e carros soltam, o barulho que fazem. O calor e o abafado que não existiam há trinta anos. Vejo os drogados.
É certo que o progresso foi muito, felizmente. Em todas as áreas do conhecimento e do viver.
Mas verifico, com segurança, que o bem foi acompanhado pelo mal.
Lastimável, isso. Mas com o Natal, renascem nossas esperanças.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Simplesmente vida

  Rosa








Difícil entender a Vida. Afinal, são muitos fatos.
O primeiro deles, talvez o mais visível, é que você está vivo. Tem consciência disso, sente a verdade. Sente fome, sente sede, sente sono. Fatos primários, que costumamos estar diante deles a qualquer instante.
Mas estes fatos, aliados com outros, mudam inteiramente a Vida humana. E o homem, queira ou não, se indaga. Já nem falo mais do velho e batido pensamento quem sou, de onde vim e para onde vou. É verdade que esta idéia é a mais forte do que muitas, mas talvez esteja sendo posta de lado quando valores diferentes se levantam.
O que é o amor, por exemplo? Os outros refinamentos não intelectuais, querendo ou não, você os encontra em cada passo do caminho. O amor pela música, pelas artes plásticas, pela literatura, e tantos outros que cansariam o leitor, que os conhece e sente.
Sentir a Vida correndo pelos pulsos, as batidas cardíacas mostram isso.
Mistério. Tudo mistério que por mais que tentemos, a gente não sabe explicar. Neste ponto, parece que tudo cessa. Estes fatos não necessitam explicação, basta poderem ser constatados.
Mas a curiosidade humana é grande demais para ser satisfeita com essas verificações. Quer ir além. Se estou escrevendo, porque faço isto? Vale à pena? Fernando Pessoa, no seu Mar Portuguez, é taxativo: “tudo vale a pena, se a alma não é pequena.”
Sentimos prazer e dor. Segundo parece, ambos andam de mãos juntas, e que não podem se apartar.
Vamos seguir uma linha simples, por motivos pragmáticos. Acordamos. Fazemos nossa higiene. Passamos à mesa do café matinal. Há os que gostam de refeição ligeira, mas frugal, se é que isto é possível. Outros se limitam ao café que tudo perfuma, inclusive nossa alma.
Alma? O que é isto? Parece que caí na própria armadilha! Alma existe? Digo, o pensamento formado por uma complexa cadeia de neurônios, que pensa com exatidão, move a nossa Vida.
Ficamos só nisso? E quando toca aquela música que agrada profundamente, muitas vezes ao ponto de chorar? E quando sentimos a mão da amada segurando firme, demonstrando carinho, afeição, amor?
Tudo isso é simplesmente inacreditável, maravilhoso.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Verdades

  Lendo no parque/Henri Labasque












Talvez ela fosse a única moça que lia no parque. O livro era agradável.
Talvez ela fosse a única que lia, enquanto mães e crianças brincavam. Brincar é bom. A pessoa sai do seu cotidiano chato, acorda, limpa-se e vai para a primeira refeição.
Dizem que o hábito faz o monge.
Faz mesmo. O costume diário nos dá um ritual, mas é bom pensar no que temos em energia. Os que escrevem, pintam, ou exercem qualquer outra atividade, não sabem mais sobreviver sem ela.
São tantos que não podem viver sem transmitir as suas convicções que de modo algum podemos fazer uma espécie da detestável censura.
A Internet é um mundo. Aparecem aqui todo tipo e espécie de gente, uns com talento, outros tentando.
Na verdade, em literatura, ninguém nasce com o talento de Machado. É preciso força, estudo e trabalho. Sem isso, nada feito.
Alheia a estas verdades, ela continuava lendo. O livro era Escolha seu Sonho. Não parecia estar escolhendo sonhos, prestava atenção demais. Uma estudante de Letras? Uma iniciante na literatura?
Só ela possuía a resposta, e ninguém perguntou nada. Cabelos castanhos, soltos, cortados Chanel. As poucas vezes que levantou a cabeça foi para olhar um canário que, como adivinhando o empenho na leitura fazia o fundo musical. Era bonita, sem a menor dúvida.
Quem gosta de frequentar parque, aproveitar a sua frescura e calma, está acostumado a ver estas cenas, que parecem saídas de um quadro impressionista.
Gostei tanto de ver a cena bucólica e com um certo mistério que resolvi escrever sobre o que assisti numa bela manhã de um dia luminoso.
Na certa que volto, esperando encontrar a jovem. Não vai ser difícil falar com ela, pois temos o mesmo gosto. Ler no parque.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Dezembro

  Noite Quente/Google















Não sei bem. Não tenho certeza, mas o mês de dezembro eu entendo pesado.
De modo algum tenho, como muitos, horror ao mês do Natal e Ano Novo. Nem fico muito mudado, mais feliz, como a maioria das pessoas.
Tenho um exemplo do qual não posso me esquecer. No dia primeiro deste mês, minha mãe tinha outro espírito. Era tomada por alegria intensa, e transmitia este fato.
Gostava de preparar a ceia de Natal; não gostava, adorava. Fazia tudo sozinha, preparava a casa e a mesa. Com todo o amor e carinho.
A toalha branca, perfumada pela lavagem cuidadosa, era enfeitada por flores e galhos escolhidos no jardim. O peito do peru, minha escolha até hoje, com uma farofa na manteiga e miúdos condenados hoje por qualquer cardiologista.
O bolo! Ah, o bolo... Minha mulher tem a receita até hoje, o caderno deixado está intacto.
Ano Novo e era a mesma coisa, mas com saladas leves. Champanhe, sempre. Festas íntimas, domésticas, afetivas e amorosas.
São recordações agradáveis que aliviam o coração.
Foi neste clima que passei minhas festas de fim de ano. Tudo era muito diferente.
As estrelas ainda luziam no céu. As cidades não eram blocos de concreto, agressivas.
Tudo mudou. Para pior, bem pior, salvo em cidades pequenas que mantêm a tradição.
É pena, uma grande pena, a materialização de festas tão bonitas.