Calor, mas nem tanto.
O homem de bermudas azuis, já não muito novo, tomava uns
chopes em bar limpo e bem frequentado, próximo ao mar, perto da praia. Sentia a suave sensação de frescor vindo do
vento marítimo, enquanto observava o mar, o céu, as nuvens e as pessoas que
passavam.
Era inevitável.
Seu pensamento foi tomado pela linda moça que havia conhecido. Ficaram muito amigos; aliás, passaram
bastante disso. Misteriosa mulher! Tinha nome, profissão definida e pais vivos e
felizes. Ela, lindíssima.
Entre outros talentos, Maria Eduarda fora modelo famoso
no Porto, Portugal. Fez o convite:
“vamos morar lá? A casa é herança, é dos meus avós”. Ambos tinham falecido, e a bela Maria Eduarda
era a herdeira e sucessora por eles nomeada, certidão passada em cartório.
Para o homem de bermudas azuis o problema não era tão
simples. Ainda trabalhando no Brasil,
uma mudança repentina era arriscada. Um
antigo laço amoroso servia para complicar mais a situação, embora não fosse
sério a ponto de impedir qualquer decisão.
O trabalho sim, este era problema, embora Maria Eduarda já tivesse
afirmado que profissões liberais, quando quem as exerce é tido como competente,
não são obstáculos ao exercício na terra dos nossos avós.
Ela estava no Porto.
Ele, no Rio. Mandou um
e-mail. Era mesmo a solução, iria ao seu
encontro e fosse o que os deuses quisessem.
A mensagem voltou no ato. O
endereço estava incorreto, ou não existia.
“Não existe como, se falei com ela ontem?”. Falei é a maneira de expressar-se. Não falou, escreveu. E também não teve resposta. A elegante e linda mulher havia
desaparecido. Nada de respostas
As saladas de alface, agrião e queijo branco, sempre
servidas na sua casa, acompanhadas de vinho branco português, de melhor
qualidade, com pão e azeitonas, não eram mais divididas pelos dois.
Ele escreveu, escreveu, escreveu e nada, as mensagens não
eram enviadas. Voltavam logo que
partiam, com a advertência de “endereço não encontrado”.
Ora, não era personagem imaginária. Ele esteve com ela! Não uma, mas várias vezes. Acontece.
É uma das facetas do mundo de hoje, mas acontece.
Quis chorar.
Lembrou-se dos angariados pelo terrorismo.
Bebeu mais um delicioso chope duplo e foi-se embora.