segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Duda

         

         Todos que escrevem sabem: inventamos muito.  Situações, fatos, pessoas.
         Inventamos?  Pode parecer que sim, mas é difícil alguma coisa vir do nada.  Melhor, não é difícil, é impossível.  Não só para escrever, mas para todos os ramos da arte.  A criação segue um processo, e nunca se pode imaginar o resultado.  Mas não parte do imaginário puro.  Nunca parte.
         Assim é que a mulher que Yuri conheceu e logo se apaixonou parecia ter surgido do nada, sem pai nem mãe, sem uma história anterior que convencesse.  Tudo parecia ilusório.  Mas não.  Ela estava — estava? — em todas as partes, no copo, no gosto do café acabado de fazer, no seu pensamento... Ora, tinha existência, portanto.
         Escrevia para ele, textos curtos, incisivos e muitas vezes contundentes.  “Você estragou nossas vidas”, quando se referia à união que não se realizou.  De nada adiantava querer negar; era o que ela pensava, dizia e estava convencida.  Negar como?  Aparecia como vinda do nada, linda, meiga, delicada e maravilhosamente entregue a um amor que Yuri nunca entendeu.  É de dar pena dele.  Foi burro, uma besta, em nome de sabe-se lá o quê.
         O que mais queria era unir-se em definitivo com o amado.  Acontece que este não acreditava que ela existisse, era sonho, ou talvez até mesmo delírio.  Estava passando por momentos de insanidade, criando fantasmas? Mas Duda apareceu, como por encanto de história de fadas.  Sentado num banco, olhando o mar, sentindo o horizonte, ouviu a voz.
         — Yuri?
         — Duda?
         Foi o mais ardente beijo, o mais gostoso abraço, os corações batiam forte, estavam colados, os olhos não se separavam um do outro, olhar que devassa a alma, fala, grita, berra e sente.  Duda era a mulher mais bonita que Yuri já havia posto os olhos, em qualquer hipótese.  A mais bonita, a mais doce, a mais encantadora, a mais mulher.
         Num repente, sumiu.

         Até hoje Yuri não sabe mais dela...

17 comentários:

Caio Martins disse...

Pois é, Mestre Jorge! Essas coisas acontecem! Delícia de texto!

Forte abraço!

Vera Fracaroli disse...

Maravilhoso Jorge, quanto mais não seja, me parece que foi um sonho que ficou pela metade, mas foi muito intenso e inesquecível, valeu a pena.
A felicidade são momentos e isso é que importa.

Adorável seu texto.

beijo!

Marcelo Pirajá Sguassábia disse...

Excelente ficção. Muito bem "inventada" e escrita! Abraços, Jorge.

Rita Lavoyer disse...

Oi, Jorge!

Tudo dentro do "já dito". Pior é quando ouvimos isso de quem não gostaríamos:

"_ Não te falei?"

Célia disse...

Nos encontros e desencontros entre a ficção e a realidade há um imenso depósito de nossos sonhos... Vivê-los é contagiante e contagioso! Contagiou-me!
Abraço.

petuninha disse...

FICÇÃO E REALIDADE SE ENTRELAÇAM NA VIDA DE UM ESCRITOR.
YURI e DUDA, É UMA BELA HISTÓRIA DE PAIXÃO. MUY CALIENTE, TERNA E DOCE.
É UM BELO TEXTO, COM UMA LINDA MULHER.
CONTO MUITO BEM ESCRIT0
PARABÉNS!

Ana Bailune disse...

Que pena... mas acredito que o momento foi tão intenso, que até hoje ela existe para ele. Bom dia, Jorge! Comprei um dos teus livros na amazon, mas ando com o tempo um pouco apertado. Vou ler, tenho tantas coisas que eu gostaria de ler, e vou lendo devagarinho...

Anônimo disse...

Que lindo!!!

Esa mulher existe ainda, viu!
Só não a deixe ir embora de novo..mas vc não teve culpa, pois o real é confundido com o irreal.
Você, como sempre, um querido e perfeito escritor. Adoro suas escritas.
Beijos e Parabéns pelo conto

marcia mesquita disse...

curto e bom
pena que sem final feliz

Unknown disse...

Jorge tem a capacidade de transformar o real em fictício, e este em real, como mostra em "Duda".
Beijo. Carmem

Marco Bastos disse...

A foto de uma mulher muito bonita e um conto delicioso. A realidade é uma percepção como outra qualquer. Para a mente são indiferentes sonho ou realidade. abrçs.

Nadir D'Onófrio disse...

Quão estranhos podem ser os caminhos do amor!
Entre a ficção é a realidade, quiça?

Importante é que nos presenteou, com mais

esta bela obra, Jorge!

Nadir

Unknown disse...

Hoje, depois, de vários eventos dos quais tive de participar, ponho-me a ler-te. E que maravilha este teu conto! Verdadeiramente um conto. Prende a atenção do leitor e tem um fim inusitado. Parabéns, Jorge.

Tais Luso de Carvalho disse...

O conto tem isso de especial: o final é tão inusitado que deixa para nós, leitores, encontrar um final, o que teria acontecido?
Parabéns, fico aqui pensando...

Abraço!

Márcia Sanchez Luz disse...

Jorge, que conto delicioso e tão cheio de poesia!

Abraços

Márcia

marcia disse...

No imaginário,tudo pode acontecer..Ótimo conto...bjus

Anderson Fabiano disse...

Texto absolutamente delicioso! Qualquer coisa que diga será pouco... então, calo.

Meu carinho,
Anderson Fabiano