terça-feira, 30 de junho de 2009

Encontro

Veleiro













Mediu a altura do Sol com um sextante, anotando a hora.
O astro estava fazendo sua passagem meridiana, que nada mais é quando ele atinge a sua altura máxima no local onde nos encontramos. De posse de poucos dados complementares, ficamos sabendo nossa latitude e longitude, uma informação preciosa.
Quase ninguém faz mais isto. Com o aparecimento do GPS, pequeno aparelho que capta sinais emitidos de satélites, é capaz de ser obtida uma posição de extrema confiabilidade, com dia claro ou nos momentos de meio crepúsculo, quando astros e horizonte do mar são avistados. Isto não ocorre em dias de chuva, ou nebulosos. Durante a noite, vemos um céu de estrelas, mas não o horizonte do mar, o que não impede o imediato encontro da posição geográfica, usando o GPS, ou global positioning system, sistema de posicionamento global.
Velejar é um esporte e uma arte. Em alto mar, o conhecimento de marear as velas, orientando de forma que peguem o máximo de vento possível, manter o rumo não permitindo alterações e não parar quieto por muito tempo é completamente diverso do que navegar em águas abrigadas, onde o perigo parece praticamente nulo.
Nosso timoneiro solitário conferiu a posição encontrada astronomicamente com a que indicava o GPS. Praticamente, nenhuma diferença, que o fez sorrir. Bebeu mais um gole do seu rum com água, abandonou a pequena mesa de navegação e foi dar uma olhada na panela onde cozinhava batatas com muita cebola, e dois dentes de alho. O peixe, vindo no corrico, uma cavala das melhores, já estava pronto. Corrico é uma longa linha cheias de anzóis iscados, que é lançada ao mar e amarrada em alguma parte firme do barco. É difícil não trazer peixe de serventia, como o que fora recolhido, limpo e filetado.
Dormiu duas horas, sono pesado, mas com o ouvido funcionando, para escutar algum eventual apito de navio, embora estivesse um pouco afastado da rota deles. Durante a noite, dorme-se com os olhos abertos, vendo-se as estrelas, fora da cabine e fortemente amarrado; pode cair no mar. É um prazer indescritível. O leme automático, guiado pelo vento, encarregou-se de timonear o veleiro. Acordou com sede. Dois copos d’água foram bebidos, num processo lento, quase um ritual.
Lavou a os utensílios usados, guardou na geladeira pequena as batatas cozidas com cebola e alho, prato indispensável a quem faz este tipo de viagem.
Voltou ao convés. Tudo em ordem. Felizmente.
Esperava, o quanto antes, atingir Dacar, o local onde sua amada o esperava. Sempre sua companheira de velejadas, desta não participou.
Grávida de sete meses deu um longo beijo no marido, e orgulhosamente exibia uma senhora barriga!
Foi um feliz encontro. São estes fatos, é o que me parece, que dão luz e graça à Vida.

4 comentários:

Elaine Ferreira disse...

Uma prosa que é poesia, ao mesmo tempo. Lindo, Jorge.

Caio Martins disse...

A cada dia, melhor,m'rmão. Dá gosto ler tuas marujadas, lá nos sentimos. Mas garanto, jamais, porém jamais, estragaria rum - que suponho especialíssimo - com água... Que sacrilégio!

Forte abraço, fico esperando a próxima.

Magno Mesquita disse...

Uma travessia técnica, emocional e sentimental. Parabéns, é raro juntar estas qualidades. Belo texto.

Roseane Ferreira disse...

Jorge,
Le-lo é um sempre aprender, seu conhecimento e clareza com que o expõe é incrível! Suas histórias de mar, barcos, vejejar eu admiro em especial!
Essa além de enriquecedora é gostosa e romântica numa sutil medida!
abraços carinhosos
Rose