sábado, 23 de junho de 2012

Notícia

















                                                       Notícia

            Redação de jornal.  Gente até dizer chega.  Um telefone especial, usado só para trabalho, toca desesperado.
            - Diga, meu chefe.
            - Praxedes?
            - Ele, Tonico.  Que voz é esta?
            - Quem está aí?  Um ferrabrás, manda um depressa.  Na setenta e sete DP.  Caso escabroso.
            - Ué, e você, que está fazendo?  Cobre a notícia!
            - Não dá.  O delegado não deixa ninguém entrar.  Só os advogados dos envolvidos.
            - Aguenta a mão aí.  Vou mandar o Lício.  É amigo do homem.
            - Manda logo, cara!  Pode chegar um na frente e adeus manchete.
            - Mas afinal, o que houve?
            - Sei lá.  Coisa de figurões, não vaza nada.
            - Fica firme.  Liga de novo se for preciso.  Vou falar com o Lício.
            Desligou e foi na sala ao lado.  Nada de Lício.  Estava devorando, num excelente restaurante próximo, sua comida favorita, era quinta-feira, prato do dia.  O redator foi lá.  Lício estava terminando os legumes, verduras, meia garrafa de vinho apenas razoável.  Branco, ia bem com o salmão.
            - Acabou, Lício?  Urgente para a setenta e sete.  Houve algo sério, aquele seu amigo delegado não deixa entrar ninguém.
            - Hélio é bravo, mas não costuma barrar a imprensa.
            - Pois barrou.  Não entra ninguém.
            - Morte?
            - Não sei, mas tenho quase certeza que não, quem passou a notícia foi o Tonico.
            Pegou um táxi.  Era melhor do que seu automóvel, não precisava ficar procurando lugar de estacionamento.  Trajeto curto, dois quilômetros, por aí.
            Na porta da delegacia, três carros elegantes, no estacionamento oficial da polícia.  Entrou e deu de cara com o detetive Luisão.  Sabia de tudo.  Uma mulher, artista famosa, fora apanhada aos beijos e carinhos com o filho, nua.
            - Quê?  Foi isto mesmo, Luisão?
            - Eu estava no flagrante, Lício.  Vi tudo.
            Não se sabe a causa de Praxedes não ter publicado a notícia.  Afinal ele não era redator de nenhum jornal importante.  Mas vetou a notícia, agora confirmada pelo seu amigo e subordinado Lício.
            Perdeu o bonde.  Um periódico concorrente não tinha estes valores.
            Vendeu durante quatro dias, faturando horrores, a notícia relegada por Praxedes.
            Acontece.  Mais do que você imagina...

15 comentários:

Rita Lavoyer disse...

Olha, só! Como correm as notícias!
Quem não bate, leva!
Fazer o quê?

Sueli Fajardo disse...

Nossaaaa! Que notícia escabrosa! Será que diante de uma notícia assim, em que o mundo louco se extasia, algum jornal negaria publicá-la? Só se ofertassem muito para abafar o caso. rsrsrs
Interessante texto, meu amigo. Gostei muito.

Célia disse...

... é até nas pomposas e ilustres famílias... quem diria, né? Só grandes águas, cachoeiras, mares, cataratas recheadas dolarmente é que conseguem "abafar o caso"... psiquiatra resolve! [...]
Abraço, Célia.

Unknown disse...

Gostei do texto. Pra mim tem jeito de conto. Diálogos rápidos, que levam o leitor a compreender o enredo. Esse tipo de texto lê-se de um fôlego. Muito bom, Jorge. Abrs. Mardillê

Marcelo Pirajá Sguassábia disse...

Concordo com a Rita: quem não bate, leva. E que notícia, heim??? Muito bom, amigo Jorge.

lino disse...

Bela crónica!
Abraço

Nadir disse...

Uma noticia quente dessas, jornal algum se negaria a publicá-la!
Acho que Praxedes estava tentando ocultar algo, que pudesse mexer com sua reputação. Estou sendo, advogada do diabo, rsrsr
Boa sua crônica, Jorge!

Jorge Sader Filho disse...

A cambada do antivírus Norton, que eu uso há anos, está avisando que a página é fraudada.
Eles não me conhecem...
Obrigados a todos pela confiança que depositam em mim.
Grande abraço,
Jorge

iderval.blogspot.com disse...

Meu mestre Jorge Sader Filho, quem escreve e o mestre sabe mais do que eu,está sujeito e disposto a escutar muita coisa.O texto é ótimo,é uma verdade,tem muitos fatos como este que a mídia esconde, esconde para não escancará mazelas de alguns poderosos.O seu texto apesar de ser direto,configura um sentido figurado para qualquer assunto.O fulcro é não expor o seu patrocinador, o seu aliado,o seu consanguíneo ou outro seu elo de ligação. Parabéns e mais uma vez agradeço por mais uma aula de como escrever e expor assuntos corriqueiros desta sociedade em decomposição.Um abraço Iderval.

Anderson Fabiano disse...

Bom dia, Jorjão,

Ainda bem que nosso querido Praxedes não trabalhava no Washington Post em 72. Já pensou o mundo sem Watergate? rsss

Beleza, parceirinho! Você se supera a cada dia.

Meu carinho,

Anderson Fabiano

marcia disse...

Ótimo como sempre...bjus

Carmem Velloso disse...

Quantas horas você escreve por dia, Jorge? Amassou!
Eu também não publicaria uma notícia destas. Pode vender muito, mas é fato que não tem importância para o povo. Ou estou sendo preconceituosa?
Parabéns pelo conto, muito bem escrito, como diz o Caio Martins, coisa de mestre.

Bjs. Carmem

Maria Luzia Fronteira disse...

Menino Jorge não sei se esse caso é verdadeiro, mas que há casos desses há escondidos no contexto do seu e noutros contextos há de certeza com personalidades poderosas sendo os que mais chamam mais a atenção do mundo.
...e uma notícia do género numa revista ou jornal é caso para esgotar num instante, mesmo os menos vendidos.
Saudades de ler seus textos.
Abraços
Manuela

Evanir disse...

Querido Amigo.
Venho fazer uma visita estava com saudades de ler suas excelentes postagens.
Gostei muito do seu texto como tods que você escreve são muito especial.
Um feliz final de semana beijos,Evanir.

Gato Vadio disse...

Já compareci no Recanto, mas reafirmo a minha admiração por aqui, também: parabéns, Xará de Charitas!