segunda-feira, 2 de março de 2009

Hemingway

Hemingway












O homem sentado, bem vestido esportivamente, aparentava ter passado dos cinquenta anos. Eram onze horas e poucos minutos, céu claro, mar limpo, céu transparente.
Bebia um gim-tônica, lentamente, enquanto escrevia num caderno de boa aparência. Via-se que não tinha medo, fato incomum nos dias atuais. A caneta era uma Parker 51, com a tampa em ouro. São poucos os que se atrevem a cometer atos assim. Qualquer desocupado com intenções menos honestas poderia com facilidade roubar seu precioso objeto. Antes de chegar,passava sempre na Bodeguita del Medio, bar famoso.
Atento ao que escrevia, pouca importância dava ao fato. A caneta corria firme, com pequenas observações de quem estava redigindo à beira-mar.
Misteriosa figura. Corpulento, de bermudas e camisa pólo impecáveis, sapatos tipo mocassim leves e confortáveis, só prestava atenção ao que escrevia, ninguém sabe o quê, além dele. O gim-tônica descia vagarosamente, embora tomado em doses significativas. Acendeu um cigarro, fato que hoje é bastante incomum, mas tempo era passado. O garçom serviu outro copo, limpo, quando percebeu que já havia chegado a pouco menos da metade o que estava na mesa. Recebeu um leve aceno de cabeça, como aprovação.
A caneta corria, cada vez mais. As leituras de revisão eram poucas. Tudo fluía como um verdadeiro rio correndo nas suas margens. Pela expressão de quem escrevia, o resultado era bom.
Outro cigarro, e mudança de copo. Bebia quatro, antes do almoço, segundo os locais, que apreciavam o trabalho solitário e constante daquele homem de barba branca, vezes aparada, vezes não.
O bar ainda existe. A cidade é Havana, Cuba.
O homem, todos dizem, era Ernest Hemingway, quando escreveu “O Velho e o Mar”, talvez o melhor livro de alguns séculos passados. Santiago continuava lutando contra o espadarte, sozinho e sangrando nas águas do Golfo. Falando consigo mesmo. A falta de Manolín, o menino que o acompanhava, era grande. O Sol queimava-lhe os olhos. Tudo era contra, mas Santiago desafiava o combate. O peixe era um lutador. Sente-se a Vida, o drama humano.
É o que contam.

3 comentários:

Anônimo disse...

Bela crônica. Jorge desenvolve muito bem os temas que aborda. Estava vendo Hemingway escrevendo "O Velho e o Mar", tão realista o escritor descreve a cena.

Anônimo disse...

Bravo, jorge!
Cada vez melhor.
Abraço. Nilsson

Carlos Lopes disse...

Sou amigo do Jorge. Ele acha Hemingway maior do que Shakespeare, e afirma para quem quiser ouvir que "O Velho e o Mar" é o melhor livro já escrito prlo homem.